Da crônica da província à guerra civil, da sátira mais mordaz ao intenso lirismo. A produção multifacetada do russo Ievguêni Zamiátin (1884-1937) se encontra em toda sua força em Xis e outras histórias (Carambaia, 328 pp, R$ 129,90), com cinco novelas escritas entre 1917 e 1921. As histórias permitem conhecer de perto a prosa experimental do escritor, vívida e moderna, mesmo depois de um século, e evidente na tradução de Irineu Franco Perpetuo, que também fez a seleção e o posfácio da edição. O volume conta ainda com uma autobiografia singela de Zamiátin (1928) e a carta que escreveu ao ditador Josef Stálin para pedir a permissão de emigrar (1931). Como a maioria dos bons escritores de sua geração, Zamiátin foi duramente perseguido e difamado por Stálin e seus asseclas – uma ironia trágica, já que tinha sido alvo também do regime czarista. A postura crítica talvez seja o único traço comum presente nas histórias dessa edição. Em Da província, um herói picaresco, péssimo aluno e açoitado pelo pai, ganha o mundo com mais sorte do que em casa. Os ilhéus satiriza os rapapés e moralismos da alta burguesia britânica em um enredo atropelado pelos signos da era da velocidade. O Norte é uma história de pescadores em meio a paisagens geladas. E em Xis, a história de um diácono “arrependido” – um daqueles “vira-casacas” abominados por Zamiátin – que abandona a religião para pregar o marxismo.