Cada um por si e Deus contra todos (Todavia, 368 pp, R$ 99,90 – Trad.: Sonali Bertuol) retoma o nome que Werner Herzog buscou dar a um de seus filmes. Ainda que à primeira vista o título possa sugerir uma visão de Herzog como um pessimista solitário, a imagem que se desprende destas páginas é a da figura do cineasta, ator, diretor de óperas e escritor alemão sempre cercado de outras pessoas, sem as quais ele considera que teria sido apenas uma sombra de si mesmo. Nos episódios aqui narrados, os personagens são familiares, amigos,colaboradores, amores e até mesmo os heróis míticos da infância passada em Sachrang, “a mais remota de todas as aldeias na Baviera” — onde o cineasta aprendeu a ordenhar vacas muito antes de fazer filmes. As memórias são acompanhadas pela constatação de que o destino, tal qual um roteiro cinematográfico, sempre reserva algumas reviravoltas. Composto de luzes e sombras, este livro traz a caverna de Chauvet, preservada no escuro de seu interior como uma perfeita cápsula do tempo, ou o poço fundo em que Herzog muitas vezes se viu desempenhando o “trabalho estranho que os filmes exigem”. Aqui cintilam lanternas de carbureto, iscas luminosas jogadas ao mar, fogos de artifício feitos da pólvora de granadas, o cosmo magnífico com o qual um dia ele se reencontrou e teve a certeza de que sua vida não seria ordinária.