Editores e livreiros independentes discutem sobrevivência em Guadalajara
PublishNews, Carlo Carrenho, 26/11/2012
LIBRE participa de debate onde panelista sugere eliminação da Amazon do mercado e onde leitores praticamente não são mencionados

A Feira Internacional do Livro de Guadalajara possui uma intensa programação para profissionais do livro. Dentro desta avalanche de eventos, merece destaque o XI Fórum Internacional de Editores que, este ano, trouxe um foco sobre a edição independente ao ocorrer simultaneamente com o II Encontro de Livrarias e Editoras Independentes Íbero-americanas. Na agenda de domingo, 25/11, uma das mesas mais interessantes foi a “Redes: como melhorar os vínculos entre editores livreiros e distribuidores por meio da construção e consolidação de redes e alianças”. Com a participação de seis panelistas, a discussão girou em torno de como editoras e livrarias independentes podem garantir sua sobrevivência por meio da cooperação mútua.

Fernando Valverde, presidente da Confederação Espanhola de Grêmios e Associações de Livreiros, lembrou da crise econômica que afeta a Espanha. “Estamos passando por uma transformação maior que afeta o livro”, declarou Valverde, “houve uma queda de 4,1% das vendas de livros em 2011 segundo o último relatório do Grêmio de Editores” ressaltou o espanhol. Valverde defendeu ainda o trabalho colaborativo em redes. “Devemos pensar a livraria do futuro trabalhando em rede com outros livreiros”, declarou. “E, no mundo digital, as soluções têm de ser coletivas ou não serão soluções”, continuou. Valverde também apontou a especialização das livrarias como uma solução de sobrevivência, assim como a busca de maneiras para se incorporar o digital no negócio. Ainda sobre as redes, o espanhol lembrou que as livrarias de bairro já estão a par do conceito, pois criam redes em seu entorno.

Já a diretora executiva da Federação Internacional de Livreiros, Françoise Dubruille, destacou em sua fala a importância das informações de vendas que as livrarias possuem. “Os dados de venda têm valor de ouro para editores e distribuidores. Quanto melhor for o trabalho dos livreiros com estes dados, mais eles serão bem vistos como parceiros naturais das editoras e distribuidoras”, explicou. Dubruille também abordou o varejo online. “Para competir online, os livreiros precisam justamente desta boa base de dados. A venda de mão em mão, na comunidade, é a principal vantagem competitiva do livreiro que deve, no mundo online, fazer o mesmo trabalho com comunidades que faz no mundo físico”, declarou. E depois, mais filosoficamente: “O desafio para os livreiros é provar sua pertinência aos editores”.

Em tempos de “país bola da vez”, a mesa não poderia deixar de ter uma presença brasileira. Haroldo Ceravolo, presidente da LIBRE (Liga Brasileira de Editoras), apresentou um panorama das atividades da associação e do sucesso de seu trabalho cooperativo com um bom exemplo de rede que editores podem formar. “Identificamos na LIBRE a possibilidade de uma ação conjunta e colaborativa”, explicou Ceravolo antes de exemplificar. “A LIBRE no Brasil é o principal porta-voz do conceito de bibliodiversidade, que penetrou no discurso brasileiro como palavra de ordem, mostrando que a LIBRE tem influência evidente na política pública do país.” O presidente livreiro ainda citou a Rede da LIBRE – um ativo grupo de discussão online das editoras associadas – como um bom exemplo de trabalho em rede e de como “as editoras independentes devem buscar a cooperação antes da competição”.

Sobre o mercado editorial brasileiro, Ceravolo demonstrou preocupação. “A situação geral do mercado brasileiro é preocupante para os editores independentes, pois com a Europa em crise e o grande crescimento da educação brasileira, o Brasil passa a ser visto como uma alternativa de negócios de retorno rápido por grandes empresas”. Para o editor, a vinda de tais grupos é uma ameaça aos pequenos e ele exemplificou com o mercado digital. “A Amazon e outras grandes empresas digitais ignoram o mercado independente, negociam de forma draconiana e não querem negociar coletivamente, mas individualmente com cada editor.”

A polêmica ficou para o final, quando o editor espanhol José Luis Poncé, da editora Bellatera, fez uma apresentação bem-humorada mas bastante crítica. “Será que não temos uma bolha editorial, como a que já existiu no mercado imobiliário, com a superprodução que fazem os independentes?”, provocou logo de saída. “Temos uma estrutura de comercialização que já tem 200 anos”, continuou provocando, antes de ler um texto de 1934 que descrevia os problemas do mercado editorial espanhol – os mesmo de hoje. Sobre as novas tecnologias, Poncé foi incisivo: “As mudanças tecnológicas sempre eliminam as cadeias intermediárias e não será diferente na indústria do livro. Mas escolhi resistir por meio de redes formadas com editores amigos”.

O editor espanhol concluiu com uma lista de ações de resistência que os editores independentes teriam que implementar para saírem da crise: (1) formação de redes sem intermediários entre editores e livreiros; (2) criação de redes entre editores e afins para buscar maior visibilidade no mercado; (3) utilizar ao máximo a impressão por demanda (“Não é preciso fabricar milhares de exemplares; é preciso fabricar quantidades que serão vendidas”); (4) criação de uma rede de editores para intercambiar autores e edições íbero-americanos internacionalmente; (5) abolir associações do mercado que “de tão estruturadas não servem para nada”e repensá-las.

Mas a ação que mais rebuliço causou no auditório referia-se à Amazon. Poncé levantou uma embalagem de livro da empresa americana e declarou enfaticamente: “Temos de eliminar a presença desta empresa; a concorrência é desleal. A plataforma da Amazon não leva a nada, apenas à morte do livreiro”.

Na audiência havia cerca de 200 pessoas, entre livreiros e editores independentes. Não havia leitores entre o público ou na mesa, que ainda contava com a presença de Déborah Holtz, presidente da Aliança de Editoras Independentes Mexicanas, e Maria Caminata, diretora da distribuidora colombiana Babel Livros. Os leitores também estiveram ausentes no debate e quase nunca foram lembrados pelos editores e livreiros. Apenas o mediador, Francisco Goyanes, declarou ao final que “a coisa mais importante é o leitor”. Mas já era tarde demais.

[26/11/2012 01:00:00]