Uma viagem gastronômica
PublishNews, 23/03/2012
Uma viagem gastronômica

Escrevo esta coluna num trem entre Marrakesh e Casablanca, de onde vou pegar o avião para Portugal e, então, de volta para o Brasil. Passei os últimos cinco dias no Marrocos e, embora esta tenha sido minha primeira viagem ao país, as dezenas de comidas que vi e provei já eram minhas conhecidas de longa data. Não que São Paulo, onde eu vivo, tenha muitas referências da cozinha marroquina – até onde eu sei, há apenas dois restaurantes especializados –, mas os livros que li até hoje sobre as receitas do norte da África serviram como uma ótima introdução ao país e como um guia de turismo diferente e informativo.

Minha principal professora nessa jornada foi Paula Wolfert, autora, entre outros, de Couscous and other good food from Morocco (Ecco, 368 pp., US$ 19,99), do recente The food of Morocco (Ecco, 528 pp., US$ 45) e de Cozinha mediterrânea (Companhia das Letras, 432 pp., esgotado – Trad. Helena Londres), o único de seus livros a ser lançado no Brasil, nos anos 1990. Paula é americana, mas morou em Tânger e ainda vai frequentemente ao Marrocos, assim como a egípcia Claudia Roden, radicada na Inglaterra, outra autora a dedicar títulos como Arabesque: a taste of Morocco, Turkey, and Lebanon (Knopf, 352 pp., US$ 37,50) e The new book of Middle Eastern food (Knopf, 528 pp., US$ 35) a tagines, couscous e outros pratos típicos. Ambas, aliás, estão indicadas para o prêmio deste ano da James Beard Foundation, na categoria "melhor livro de culinária internacional".

Foi por causa delas, da precisão com que elaboraram as receitas de seus livros e da descrição cuidadosa que fizeram dos hábitos alimentares locais, tanto os do cotidiano quanto os dos dias de festa, que eu desembarquei no país e quase morri de emoção ao ver, num mercado municipal, nos souks, em restaurantes e na caótica praça Jeema el Fna, em Marrakesh, as enormes bacias de azeitonas temperadas, um moço por trás de um balcãozinho preparando massa de pastilla, as barraquinhas vendendo damascos, tâmaras e figos secos, os franguinhos prontos, os caramujos "comestíveis", os docinhos de amêndoas. Esses foram, para mim, os principais pontos turísticos dos lugares por onde passei.

Quando bem-elaborados e escritos, livros de cozinha dedicados às receitas de um país ou região familiarizam as pessoas com os sabores, o aspecto e até com o cheiro de cada lugar. E servem como ótimos guias também na hora de comprar as comidinhas que matam a fome fora de hora durante a viagem e dos temperos que levamos na mala para tentar reproduzir, em casa, algumas delícias que descobrimos durante as férias. Estou voltando do Marrocos com cominho, gengibre moído, four spices e ras el hanout, uma mistura local que eu jamais conseguiria reproduzir em casa (até porque, dizem os marroquinos que ela tem alguns ingredientes secretos), e de cuja existência só fiquei sabendo porque cansei de ler a Paula Wolfert.

A exemplo do Marrocos, dezenas de outros países ganharam edições caprichadas sobre sua culinária – a própria Claudia Roden escreveu uma delas, o recente e muito elogiado The food of Spain (Ecco, 624 pp., US$ 45). E assim, com os livros de cozinha, nossos horizontes se abrem ainda mais.

[22/03/2012 21:00:00]