"Tô muito satisfeito, rapaz", comentou Rubens Figueiredo, com um interlocutor, sobre o fato de ter vencido a nona edição do Prêmio Portugal Telecom de Literatura na noite de ontem. Com a voz baixa e um jeito tímido, mas visivelmente alegre, o escritor e tradutor carioca de 55 anos ficou em primeiro lugar com o romance Passageiro do fim do dia (Companhia das Letras, 200 pp., R$ 40,00), obra que já havia recebido o Prêmio São Paulo de Literatura em agosto deste ano.
O segundo lugar do Portugal Telecom ficou com Gonçalo M. Tavares, escritor angolano que recebeu o prêmio maior em 2007, por Jerusalém, e este ano foi reconhecido por Uma viagem à Índia (LeYa, 480 pp., R$ 44,90). Marina Colasanti, autora ítalo-brasileira, ganhou o terceiro lugar com Minha guerra alheia (Record, 288 pp., R$ 39,90) que mistura memórias e jornalismo.
As três obras foram escolhidas como as melhores escritas em português e publicadas no Brasil em 2011, entre dez finalistas que haviam sido anunciados em setembro e, antes disso, entre 50 obras avaliadas na etapa inicial da premiação.
Passageiro do fim do dia, que agora soma dois dos mais importantes prêmios literários do país, foi escrito em quatro anos, durante as horas vagas de Rubens Figueiredo entre traduções, aulas em uma escola estadual e a escrita de outros livros. Foi um tempo em que o autor experimentou, jogou textos fora, reescreveu e amadureceu a narrativa. O livro narra a viagem e as elucubrações do jovem Bruno dentro de um ônibus municipal. Para escrevê-lo, Figueiredo partiu de suas próprias observações como usuário de transporte público ao longo de 25 anos. Seu desafio foi encontrar significado em uma situação cotidiana, aparentemente banal. "Na maior parte do tempo, andar de ônibus era insignificante, repetitivo. Demorou até que eu parasse de ver como algo mecânico e vazio", disse. Para um próximo livro, Figueiredo afirma que ainda está "pensando". "Gosto de escrever quando tenho algo a dizer, a perguntar."
No caso de Gonçalo Tavares, o que ele tinha a dizer, ou a perguntar, era sobre o fascínio do Ocidente pelo Oriente, especialmente do ponto de vista espiritual. E com base nessa ideia ele elaborou uma epopeia em que retoma a estrutura de Os Lusíadas, de Camões, mas já não trata de uma aventura coletiva, e sim da viagem individual do português Bloom. O protagonista, sujeito solitário e egoísta, “quase um anti-herói”, nas palavras de Tavares, vai ao Oriente em busca de um mestre espiritual e encontra, do outro lado, alguém mais materialista do que ele próprio.
Para além da ficção, o terceiro lugar do Portugal Telecom consagrou o relato autobiográfico, e ao mesmo tempo jornalístico, de Marina Colsanti. Minha guerra alheia reconta as memórias infantis da autora, que presenciou combates da Segunda Guerra Mundial e mudanças de cidade com a família, até fixar-se no Brasil. A vontade de escrever o livro surgiu há onze anos e foi adiada por outros compromissos. "Mas eu sempre soube que o escreveria”, disse. Curiosamente, Marina diz que em nenhum momento questionou suas próprias memórias sobre os episódios vividos. “Não tive dúvidas, porque foram tempos muito intensos. A gente grava.”
O Portugal Telecom premia o vencedor com R$ 100 mil, o segundo lugar com R$ 35 mil e o terceiro, com R$ 15 mil.
