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Um brasileiro em Berlim
PublishNews, Julie Krauniski, especial para o PublishNews, 12/09/2011
Bernardo Carvalho participa da conferência “Uma busca ao longo do rio Xingu em Nove noites” no Festival Literário Internacional de Berlim

Ontem, dia 11, Bernardo Carvalho falou sobre Nove noites (Companhia das letras, 2002) no Festival Literário Internacional de Berlim. Trata-se de uma ficção, embora esteja baseada em fatos, experiências e pessoas reais. “É uma combinação de memória e imaginação – como todo romance, em maior ou menor grau, de forma mais ou menos direta”, conta o autor nos agradecimentos do livro. Esta é uma das questões que intrigam o leitor do início ao fim. O escritor não dá pistas nem em entrevistas. Mas, ontem, revelou muito sobre o trabalho.

A história é uma experiência de alteridade extrema. Fala sobre um antropólogo norte-americano que veio para o Brasil, em 1938, a fim de estudar os índios Trumai, uma tribo ainda intocada pela civilização e em vias de extinção. Não conseguiu autorização do governo e acabou indo viver entre os Krahô, no Tocantins. Buell Quain se matou na floresta, em 1939, aos 27 anos.

A obra é dividida em dois tempos – há relatos, em forma de cartas, sobre o antropólogo entre os índios; e a investigação do narrador que, 62 anos depois do suicídio, passa a pesquisar obsessivamente a vida de Buell em busca de pistas que expliquem sua morte.

De fato, Bernardo ficou obcecado pelo caso ao ler um artigo de jornal no qual citava o suicídio do estudioso norte-americano. O que ele não sabia era o motivo daquela frase ter o atingido tanto. "A citação despertou o romance que já estava, há algum tempo, se construindo em mim. Mas eu não tinha consciência disso, na época", contou o autor no encontro. Mergulhou, então, em seis meses de investigação pesada. Até viver entre os Krahô ele foi. "Achei que só conseguiria escrever se passasse pelo mesmo que o antropólogo. Esta é a parte mais cômica do livro.". Depois da pesquisa exaustiva, enviou cerca de 150 cartas para os supostos familiares de Buell. Tragicamente, as correspondências chegaram nos Estados Unidos junto com os envelopes com antraz, após o 11 de setembro. Muitas cartas voltaram e as outras provavelmente nem foram abertas. "Neste período, descobri que a investigação de um suicídio está fadada ao fracasso. Entendi que a obsessão era um pretexto para o romance. Só literatura poderia dar o que eu procurava. Foi aí que a ficção apareceu. E veio junto com minha memória de infância, em especial as viagens com meu pai pelo Xingu.", disse o autor.

Pelo romance, Bernardo Carvalho recebeu o prêmio Machado de Assis, da Biblioteca Nacional, e o Portugal Telecom. O livro foi publicado na Alemanha, em 2010, com o título Neun Nächte (Luchterhand Literaturverlag). O sol se põe em São Paulo (2007) e Mongólia (2003) também estão disponíveis nas livrarias alemãs com os títulos In São Paulo geht die Sonne unter (Luchterhand Literaturverlag, 2009) e Mongólia (BTB Verlag, 2007). "O filho da mãe já está traduzido, mas não sei quando será publicado”, disse o autor em entrevista. No Brasil, tem 11 livros de ficção publicados pela Companhia das Letras.

Bernardo nasceu em 1960, no Rio de Janeiro. Foi editor e correspondente internacional do jornal Folha de S. Paulo por mais de 15 anos. É escritor, crítico literário e tradutor. Pelo livro Mongólia recebeu os prêmios Jabuti e APCA (Associação Paulista de Críticos de Arte). Desde abril, é bolsista do Berliner Kunstlerprogramm, programa de residência artística em Berlim. O autor conta que a bolsa é dada pelo DAAD (Serviço Alemão de Intercâmbio Acadêmico) a escritores, músicos, artistas plásticos e cineastas. “Os escritores têm de apresentar um projeto de romance quando se candidatam, mas esse projeto não precisa estar ligado à cidade, nem ninguém vai cobrar do bolsista o livro pronto depois de um ano em Berlim. Você tem total liberdade de escrever o que quiser”, disse o autor.

Para quem quiser acompanhar um pouco a experiência de Bernardo na Alemanha é só acessar o blog Diário de Berlim.

[12/09/2011 00:00:00]
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