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Mordomo, Cofre-Porquinho e Arroz nos Noivos
PublishNews, 17/12/2010
Manuais Disney e a formação de leitores

Nas poucas estantes de livros que sobraram nas casas é raro encontrarmos os Tesouros da Juventude, uma coleção que conviveu com a infância e a juventude de gerações a partir dos anos 1920. Os Tesouros eram uma janela, ou muitas janelas, abertas para o mundo, com textos atraentes e páginas bem editadas e ilustradas sobre história, cultura, ciência, geografia, biografias, mitos e os mais variados assuntos.

Era uma forma de conhecimento e de estudo, mas também de lazer e de diversão, em épocas nas quais estes diferentes usos ou formas de leituras podiam ser combinados, assim como os Tesouros podiam ser lidos em diversas combinações familiares. É verdade que uma leitura crítica acharia graça, hoje, na idéia do que deveria ser um “homem culto” e na forma como o mundo era apresentado, às vezes como um gabinete de curiosidades a ser explorado por um bem informado viajante (para não dizer colonizador) europeu.

Depois os Tesouros foram parcialmente substituídos pelas enciclopédias nas estantes familiares. Em outra coluna, lembrei das enciclopédias em fascículos da década de 1970, como Conhecer, Como Funciona e Nosso Século. No início daquela década começaram a ser publicados pela Editora Abril os “manuais” da Disney, almanaques de conhecimento e de entretenimento. Não tinham a densidade editorial dos Tesouros da Juventude, é verdade, mas lembro perfeitamente bem do encanto que suscitavam nos leitores-mirins da época.

É claro que a marca Disney e a dos seus personagens era forte, mas havia naqueles manuais uma mescla de conhecimentos e curiosidades, informações atualizadas e lendas e mistérios, fatos sérios e brincadeiras, sempre apresentados de forma lúdica em páginas ilustradas que incluíam humor e charges. Podiam ser lidos por leitores realmente jovens, das primeiras séries do primário (fundamental I).

O primeiro da série, em capa dura, foi o Manual do Escoteiro-Mirim, lançado em 1971, e fornecia informações que iam desde aprender a ler um mapa e se localizar com uma bússola e por meio das estrelas até dicas de fotografia e os passos para fazer uma fogueira em um acampamento. As informações “escoteiras” eram também uma forma de escapar do mundo urbano e olhar a natureza e o universo, enfatizando as ferramentas e os instrumentos para tal.

Depois foram publicados, até 1975, os manuais do Mickey (aventuras, espionagem, polícia e crimes), do Professor Pardal (invenções), da Maga & Min (magia, mistérios, lendas e mitos), Tio Patinhas (dinheiro, economia), do Zé Carioca (futebol), do Peninha (jornalismo e comunicações) e do Gastão (sorte e azar). Eles são super coloridos e as ilustrações interessantes e simpáticas. Alguns ganhariam novas edições no final dos anos 1970, também em brochura, e depois foram lançados novos manuais, em parte temáticos, entre eles Magirama. Mas aquela primeira edição da primeira metade dos anos 1970 é uma preciosidade de infância.

O Manual do Mickey apresentava assuntos tais como: Escafandristas e Homens-Rãs, Jahú e sua Epopéia, Jim das Selvas, Marechal Rondon, Zorro, Travessia do Atlântico Norte (em Aventuras, Aventureiros e Feitos Históricos), Algemas, Cães-Detetives, Cangaço e Cangaceiro, Lei Seca, Mordomo, Polícia Montada, (em A Lei e os Fora-da-Lei), Armas de 007, Espiões do Espaço, Espiões na Literatura, Modesty Blaise (em Espionagem e Espiões), Tribunal do Júri e Vamos Brincar de Detetive? (em Diversos). Ao final, uma excelente lista cronológica de romances policiais e de aventura.

O Manual do Patinhas trazia temas como: a Gorjeta, A Caixa Registradora, A Casa da Moeda, O Banco que Não é de Sentar, Os Irmãos Metralha, O Banco do Brasil, O Pão-Duro – Esse Conhecido, Quanto Valem as Presas de Um Elefante, Falência, A Galinha dos Ovos de Ouro, O Cofre-Porquinho, Extração de Ouro, A Caixa Econômica, O Pedágio, Sistemas Monetários – Padrão-Ouro e Padrão-Dólar, A História do Comércio, Há Ouro nos Outros Planetas, O Forte Knox, O Prêmio Nobel, Inflação – Que Bicho é esse?, Tesouros Perdidos, Caderneta de Poupança e assim por diante. São listas quase inconsequentes, que só uma boa dose de criatividade, e também de ousadia editorial, permitiu reunir em “manuais” destinados a crianças.

Os manuais ocupavam também, talvez em proporção menor do que os Tesouros da Juventude, um espaço de curiosidade e de conhecimento em uma época na qual havia muito menos opções editoriais para crianças e a televisão tinha raros programas infantis e educativos, embora nos anos 1970 já tivéssemos a revista Recreio e, claro, “O Sitio do Pica Pau Amarelo”. Ao folhear os manuais Disney, valorizo cada dia mais essa combinação atraente de leitura, informação, conhecimento, curiosidades, entretenimento, humor, sem infantilizar em demasia os assuntos e sem banalizar a informação.

Desejando a todos os leitores do PublishNews um ótimo ano novo, termino com mais uma pequena e curiosa lista compilada do Manual do Gastão, sobre sorte e azar...: Apostas na Inglaterra, Arroz nos Noivos, Azar no Mar Cassinos, Corrida de Caracóis, Figa, Gato Preto, O Gastão da Loteca, Jogo do Piolho, Muiraquitã, Pé-Frio, Praga do Faraó, Realejo, Sexta-Feira 13, Trezes e mais Trezes (em Coisas da sorte do azar), Ciganos e a Sorte, Kaiser Guilherme II, Milionários da Loteca, Napoleão, Náufragos da Sorte e Sorte Vence Azar (em Gente de sorte e de azar). Feliz 2011!

Roney Cytrynowicz é historiador e escritor, autor de A duna do tesouro (Companhia das Letrinhas), Quando vovó perdeu a memória (Edições SM) e Guerra sem guerra: a mobilização e o cotidiano em São Paulo durante a Segunda Guerra Mundial (Edusp). É diretor da Editora Narrativa Um - Projetos e Pesquisas de História e editor de uma coleção de guias de passeios a pé pela cidade de São Paulo, entre eles Dez roteiros históricos a pé em São Paulo e Dez roteiros a pé com crianças pela história de São Paulo.

Sua coluna conta histórias em torno de livros, leituras, bibliotecas, editoras, gráficas e livrarias e narra episódios sobre como autores e leitores se relacionam com o mundo dos livros.

** Os textos trazidos nessa coluna não refletem, necessariamente, a opinião do PublishNews.

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