Tudo sobre doces
PublishNews, Redação, 10/09/2010
Livro de referência, escrito em 1892, mostra qual o uso, os ingredientes e as formas de consumo dos doces no Brasil

Organizado pelo antropólogo e historiador Raul Lody, o Dicionário do doceiro brasileiro(Senac São Paulo, 328 pp., R$ 70), livro de Antonio José de Souza Rego, do século XIX, é uma compilação de 940 receitas de doces elaborados nas cozinhas brasileiras (muitos dos quais consumidos até hoje). Ao livro, Lody acrescentou um glossário que não faz parte da edição original.

As receitas são elencadas em ordem alfabética, assim como na versão de 1892, e entre elas estão as de arroz-doce, cocada, diversos tipos de bolo, geleias e até xaropes com limão, tamarindo e caju. Além dos ingredientes e indicações de preparo, há também comentários feitos pelo organizador nos quais ele contextualiza seu uso social e sua origem.

Ainda no texto de apresentação, Lody mostra a importância do açúcar como ingrediente essencial na elaboração dos doces. Revela também sua importância econômica e cultural. Relata, por exemplo, que a especiaria, no século XIV, era tida como um presente, um símbolo equivalente ao ouro. O açúcar era a base para o preparo dos doces, já que, na época, a cana-de-açúcar era um dos produtos em evidência no país.

O leitor acompanha como se sedimentou uma forma típica de elaboração de doces no Brasil e como a influência indígena, africana e, sobretudo, europeia contribuíram para criação da doçaria no país. Para mostrar esse cenário, o organizador dá destaque para os bolos. “O bolo sempre teve relevante sentido social, marcando e acompanhando todos os momentos da trajetória de uma sociedade”, afirma Lody.

Outro destaque é a variedade de receitas portuguesas, como os pães de ló (o pão de ló de amêndoas, pão de ló à francesa, pão de ló da Ilha da Madeira e o pão de ló de milho).

Para Lody, cada receita é um encontro, uma descoberta, uma forma de manter um conhecimento familiar. Por essa razão, Souza Rego concebeu o Dicionário como um caderno de receitas, que oferecia diferentes cardápios e apresentava as maneiras de comer no dia a dia e nos momentos de festas.

Receitas são transmitidas por gerações e afirmam o sentido patrimonial e de pertencimento. E esse é um dos propósitos do livro: mostrar como uma sociedade se organiza e constrói identidades por meio da gastronomia.

Rceitas encontradas no livro

Arroz-doce Imperial – Lavam-se em três águas 250 gramas de bom arroz escolhido e se deita em uma caçarola com litro e meio de leite a ferver; deixa-se cozer, tem­perando-o de sal, pouco, e lhe deitando um pau de canela e uma casca de laranja; deve ferver muito devagarzinho. Em estando cozido, deita-se-lhe o açúcar necessário para ficar doce, e mexe-se com uma colher de pau, observando se o arroz está cozido e se precisa de mais algum leite. Es­tando cozido, tira-se do fogo, deitam-se-lhe 100 gramas de manteiga de vaca e um quartilho de nata e mexe-se muito bem, em cima do lume, até ferver; tira-se então para fora do fogo; em estando frio, deitam-se-lhe 24 gemas de ovos crus e mexe-se bastante até ficar bem ligado. Depois, ajunta-se-lhe com muito jeito, para não se desmanchar, o pudim de ovos que se cortou, e deita-se a massa em uma ou duas formas untadas com manteiga de vaca sem sal, e levam-se a cozer em banho-maria.

Bolo Paulista – Batem-se 12 gemas de ovos com 500 gramas de açú­car, ajuntam-se-lhes 500 gramas de fubá de arroz ou araruta, 500 ditas de manteiga derretida, um pouco de sal, erva-doce e um pouco de sumo de limão. Estando tudo bem ligado, acrescenta-se a neve feita de dez claras de ovos batidas; continua-se a bater durante mais de um quarto de hora, até a massa estar cheia de bolhas e até o momento de se pôr a massa na forma, que deve ir imediatamente ao forno quente. Estando cozido o bolo, vira-se sobre um prato, e enfeita-se com açúcar vidrado.

Pão de Ló da Ilha Madeira– Batem-se bem com dois garfos 4 ovos, e depois, sem cessar de bater, vão-se deitando dentro, pouco a pouco, os seguintes ingredientes na ordem que se segue: 180 gramas de açúcar peneirado, outro tanto de farinha de trigo peneirada, 120 gramas de manteiga derretida, mas não quente, a casca de um limão verde, e, na ocasião de deitar-se na forma, mistura-se dentro a terça parte de uma colher de chá de carbonato de soda, e leva-se logo ao fogo, durante uma hora. A manteiga derretida vai-se ajuntando devagarzinho, e enquanto uma porção não está bem misturada não se ajunta outra. Pode-se deitar também um pouco de cidrão em pedacinhos, mas o que é essencial é bater o pão de ló sempre até que vá para o forno.
[10/09/2010 00:00:00]