Carioca de múltiplos talentos, o escritor, jornalista, músico e pintor Rodrigo de Souza Leão morreu prematuramente em 2009, aos 43 anos, em uma clínica psiquiátrica. Autor do romance Todos os cachorros são azuis - finalista do prêmio Portugal Telecom 2009 e que ganhará uma adaptação para o teatro - e da reunião de poemas Caga-regras, o escritor conviveu com a esquizofrenia por mais de 20 anos. Mas isso não o impediu - muito pelo contrário - de produzir intensamente. Agora, a Record começa a reeditar, com organização e curadoria do poeta e jornalista Ramon Mello, toda a sua obra.
Antes disso, porém, lança o inédito – e último escrito - Me roubaram uns dias contados (336 pp., R$ 47,90) nesta sexta-feira (2), exatamente um ano após sua morte. Às 19h, na Livraria Museu da República (Rua do Catete, 153 – Catete – Rio de Janeiro/RJ), haverá um debate com Franklin Alves Dassie, Leonardo Gandolfi e Suzana Amaral, e mediação de Ramon Mello.
Neste romance que beira a autobiografia, o autor ignora os limites do texto e mergulha na condição humana, apresentando uma variedade de protagonistas inseridos numa realidade singular, em que todos caminham para uma grande metamorfose. Rodrigo é, ao mesmo tempo, autor e personagem de suas próprias histórias. Mas ele ignora com habilidade e extrapola esses limites em que a noção de realidade está o tempo todo em expansão, produzindo uma comunidade de muitos protagonistas.
No livro, a polifonia de vozes tece laços, mais do que afetivos, criados pelos personagens. Não há um único Rodrigo, há muitos e distintos entre si. Mas entre tantos personagens o leitor com certeza localizará semelhanças e serão essas semelhanças que farão o livro - sua vertiginosa história - fluir com a naturalidade, ora de um conto de fadas, ora de um romance policial, como explica o poeta e amigo Leonardo Gandolfi, que assina a apresentação do livro.
Humor, ironia, derrisão fazem as palavras, muitas vezes duras, fruírem espontaneamente em meio a sorrisos amarelos. Como o autor se desdobra em personagens, este livro se desdobra em outros livros - o que só faz sentido se estiverem reunidos dentro do mesmo caos: sexo virtual, gozofones, eletrochoques, perseguições da CIA ou KGB, filmes, músicas, pinturas, poemas e cacos emocionais...
Me roubaram uns dias contadosé um belo mergulho na condição humana; em especial, na dura tarefa de existir de um escritor, que convive não só com seus fantasmas, mas também com seus remédios.